GRANDES EPIFANIAS

GRANDES EPIFANIAS
Manifestações divinas acontecem. Elas podem ser vistas em iniciativas
como a de Glauber, um rapaz que há três anos abdicou de tudo que lhe
 era supérfluo – além de alguns bens necessários – e passou a acolher
moradores de rua em uma comunidade formada em Suzano.

Por Monique dos Anjos


Domingo,13 de outubro de 2002, seis e trinta da manhã. Um grupo reúne-se para um passeio que mais parece uma excursão para a praia (o que não seria uma má idéia. Apesar da primavera a temperatura está elevadíssima). Mas ao invés de bronzeadores e roupas de banho, eles estão munidos de terços, bíblias e um forte desejo de passar a palavra de Deus. O destino do ônibus é a comunidade Recanto da Esperança, em Suzano, a 45 quilômetros de São Paulo, onde funciona um centro de recuperação para ex-moradores de rua – muitos deles dependentes químicos – que oferece tratamentos de desintoxicação e orientação emocional.
O responsável pelo local é Glauber de Araújo Lima, um rapaz de 26 anos que conta ter recebido um convite de Deus para realizar essa grande obra. “Eu ia às ruas uma vez por semana para levar roupas e alimentos e sempre ouvia pedidos de socorro. Eram pessoas que não agüentavam mais a vida que levavam e queriam uma chance para recomeçar”, lembra.
Glauber não se fez de rogado. Atendeu ao chamado Divino e resolveu pôr a mão na massa. Vendeu seu carro, comprou uma chácara e começou a abrigar moradores de rua, pessoas que não tiveram chances como as nossas ou que simplesmente não souberam aproveitá-las.
Desde que  o centro foi fundado, há três anos, mais de 120 homens já receberam tratamento. “O período ideal de internação para gerar bons resultados é de seis meses”, conta Claudemir Roberto Carvalho, ex-interno e hoje monitor. “Determinamos o tempo, mas não obrigamos ninguém a permanecer aqui”.
O tratamento inclui a manutenção da chácara, que acaba servindo de terapia e lhes ocupa o tempo. E por falar em terapia, toda segunda-feira duas psicólogas voluntárias oferecem consultas individuais aos acolhidos.
“Tentamos cuidar não apenas da dependência química ou alcóolica, mas também do que os levaram a esses caminho”, completa Claudemir.
O centro tem capacidade máxima para 15 pessoas. Mas já chegou a receber 17 de uma só vez. “Infelizmente não temos estrutura para receber mais do que isso. Falta muita coisa. Desde comida a produtos de higiene”, lamenta Glauber.
As visitas acontecem no segundo domingo de cada mês. E muito embora os internos soubessem que algumas pessoas se dirigiam para lá, não tinham a menor idéia do que aquele domingo lhes reservava.
Eles aguardavam os voluntários da

Igreja Nossa Senhora da Paz, no Parque do Carmo, Zona Leste de São Paulo. A viagem foi organizada pela coordenadora do grupo de amparo da paróquia, Dona Antonieta Souza com o apoio do coordenador do grupo de jovens, Douglas Arrais. Dona Antonieta, em uma paciente  entrevista reafirmou a importância de agirmos como instrumento do Senhor e prestar assistência aos necessitados.
A recepção foi amistosa, mas não muito calorosa. Mal sabiam aqueles homens que no final do dia seus rostos teriam outro semblante. Estariam iluminados.
Também se dirigiu para lá uma equipe da Paróquia Nossa Senhora do Carmo, da Vila Alpina, Zona Leste de São Paulo, acompanhada pelo padre Fausto Marinho de Carvalho Filho.
Ao chegar na chácara o primeiro passo foi definir quem faria o quê. Alguns ficaram encarregados de preparar as refeições, outros do teatro e da apresentação. Andréia Cristina Garcia foi uma das escolhidas para ficar em vigília. Ela passou o dia rezando pelo sucesso desse trabalho de evangelização e por cada um dos presentes. “Estou feliz por estar aqui e espero passar para eles que precisamos de Deus em nossas vidas. Sem Ele não temos força para nada.”
Entre um louvor e outro foram apresentadas peças teatrais que trataram de temas como a importância do perdão e o perigo das tentações do mundo. Além de três palestras. Marcos Kanashiro  – responsável pela vigília –  falou sobre o amor de Deus. Amor esse bem diferente daquele visto nos filmes e nas novelas. Marcos falou sobre um amor como o de Cristo, que morreu por nossa salvação. Andréia Vieira palestrou sobre Nossa Senhora e Douglas Arrais falou sobre o relacionamento entre pais e filhos. Varlei Gonçalves estava na chácara a convite de seu primo (um dos integrantes da banda), e não conteve as lágrimas durante a palestra de Douglas. “Não chorava assim desde a minha infância. Foi muito bom para aliviar a dor que estava sentindo aqui dentro”.
Varlei não foi o único. Muitos dos homens que haviam começado o dia com feições carregadas deixaram a emoção falar mais forte e não hesitaram em chorar. Era Deus agindo em suas vidas e falando a eles que apesar de todas as provações pelas quais passaram, em nenhum momento estiveram sós.
“Viemos plantar uma semente no coração deles. Mas é preciso regá-la até que germine. Esse processo não pode parar por aqui”, afirma Douglas.
A visita foi encerrada com uma missa a céu aberto celebrada pelo padre Fausto, que abençoou o lugar e todos os espectadores.
No fim da tarde todos queriam saber quais teriam sido os resultados daquela obra. Sérgio Ferreira, internado há quatro meses, os ajudou a descobrir.
“Esse foi o melhor momento que passei aqui. Me deu forças e ajudou a recuperar minha fé, disse. Não foi preciso ouvir mais nada. O grupo partiu com a certeza de que dessas sementes proverão frutos da fé, da persistência e do amor divino. E já estão prontos para a próxima viagem.